segunda-feira, 31 de março de 2008

Mais sobre a vida e a morte

No primeiro ano de faculdade, tive um professor de Filosofia chamado Jordino Marques. Devia estar na faixa dos 60 ou 70 anos. Era padre, diabético, usava uma perna mecânica e conhecia não sei quantas línguas, entre elas pelo menos duas línguas mortas. Era a princípio bruto, mas aos poucos revelava um lado doce. Tinha um humor ácido. Entre as muitas lendas que corriam a seu respeito, uma delas é de que ele adorava pescar, quando ainda tinha tinha as duas pernas. Achei isso muito doce. Veja só, o professor Jordino, padre, diabético, que lia Heidegger em alemão e sabia aramaico, adorava pescar!

Acho que foi no quarto ano de faculdade que recebi a notícia de seu falecimento. Entre os lamentos, lembro bem de um comentário, que dizia: "É uma pena perdermos uma pessoa tão cheia de conteúdo. Sabia várias línguas, publicou livros, deixou um livro pela metade. Pense no quanto ele poderia acrescentar ainda, quantas obras poderia publicar!" Alguém se lembrou de que ele ainda poderia pescar, se estivesse vivo?

Quando eu morrer, não quero que pensem no quanto produzi ou poderia produzir. Quero que pensem em tudo que vivi e poderia viver. Que digam que eu aproveitava a vida, que amava e era amada, que tinha grandes amigos, uma família querida, que gostava de passear, de comer, que queria a casa sempre cheia. Não quero ser uma pessoa que produz. Quero ser uma pessoa que vive e que ama.

6 comentários:

Maria Cristina disse...

ah, nunca parei p pensar isso não, o q vão dizer depois que eu morri... Me lembro da notícia do falecimento do Jordino, foi num carnaval e lembro também do meu ex-professor de História no segundo grau dizendo: Uau, vc é aluna do Jordino Marques!!!

Unknown disse...

Eu também quero assim.

Julia Lemos disse...

talvez seja justamente por essa sua sede enorme de viver, que você é uma das pessoas que eu conheço que mais vive a vida de verdade, tendo como fim principal simplesmente viver. o resto, na sua vida, é meio e conseqüência dessa sua busca. Tenho essa imagem de você e a tenho como um grande exemplo pra mim.

Anônimo disse...

Na verdade nunca conheci o Jordino, mas também soube da morte dele durante o Carnaval. Estava em Goianésia e o avó do Fellipe, amigo dele, recebeu o telefonema. Aí me contaram que o Jordino era da UFG.
Mas enfim, concordo com vc! Só espero que apenas os mais novos, bem mais novos que eu, lembrem de mim. Afinal, quero morrer beeeem velha..heehe. Beijos!

Marcos Carvalho Lopes disse...

Estava procurando algo sobre o Jordino e "caí" no seu blog. Sempre brinco dizendo que depois que morreu ele virou meu daimon: toda vez que digo algo irônico é ele quem sopra. Estava contando essas coisas na UFRJ e uma amiga (a Susuna da filosofia) perguntou se conhecia a Lian q fazia comunicação em Goiás... disse q não, mas no último ano da faculdade tinha realmante uma menina oriental do jornalismo que inventou de dar comida pros macaquinhos (acho que pipoca) e quando viu os macaquinhos estavam correndo atrás dela. Será que era você?Inté

Unknown disse...

navegando, deparei-me com a notícia do falecimento do Jordino. somente agora, alguns anos depois. triste. Jordino foi o padre que casou-me na Alemanha, quando ambos fazíamos doutorado lá, eu em Direito e ele em Teologia. sujeito maravilhoso. guardo grandes recordações daqueles tempos. bonito você ter escrito tudo isto em seu blog.