sábado, 31 de dezembro de 2011

Um não-cartão


Em 2011 eu... Me mudei de casa. Adotei um gato. Bati o carro. Lutei por um antigo amor e, quando consegui, descobri que não era isso. Estive do outro lado do mundo. Cortei o cabelo. Doei sangue. Subi a Pedra da Gávea. Mergulhei na Grande Barreira de Corais. Fiz tatuagem. Me formei em teatro. Casei minha melhor amiga. Me apaixonei. Pensei em mudar de cidade. Aterrissei em Bali sem dinheiro no bolso. Fiz amizade com mendigo. Quis virar mendiga. Fiz rapel descalça e com short de pijama. Aprendi a fazer arroz. Tive dread no cabelo. Dormi em aeroportos e McDonalds 24horas. Voltei à Yoga.

E, sobretudo, fui tão, tão feliz. E acabei atropelada pelo tempo e não conseguindo enviar cartões às pessoas queridas.

Mas quero registrar minha gratidão a todos que estiveram em minha vida. Aos que me abrem as minhas portas e me ensinam sobre mim. Aos que me permitem os mergulhos. Aos que me elevam. A quem sempre lembra. A quem sempre está. A quem está de vez em quando. A quem eu gostaria que estivesse. A quem me apoiou nos projetos acadêmicos e poéticos. A quem me vestiu com máscara de minha mesma face, para que eu me tornasse personagem. A quem me fotografou com as lentes da arte. A quem me pintou com cores vibrantes. A quem me escreveu com doçura inventada. Peço perdão aos que não consegui amar. E devolvo amor aos que não me amaram. Lembranças aos que encontrei pelo mundo. Força aos que me apoiaram, sobretudo nas loucuras. Aos que me ouviram. Aos que me enxergaram.

Um 2012 de enxerga. De escuta. De amor.

Um 2012 de loucura e de arrebatamento.

De mergulhos e escaladas.

Sigamos.

O mundo vai começar...


quarta-feira, 14 de dezembro de 2011

No fim...


Virou moda nas redes sociais postar cápsulas de auto-ajuda sem critério. Imagens com mensagens que dizem como se deve agir e o jeito certo de encarar o mundo. É verdade que às vezes, dependendo do tamanho do absurdo, eu me divirto e até me irrito. Mas normalmente costumo ignorá-las, mesmo que façam algum sentido. É que nunca aceitei que me apontassem caminhos.

Por isso me espantei ao perceber que uma dessas frases, postadas por alguém, continuava rondando meus pensamentos por dias e dias. Havia aqueles que concordavam, curtiam e compartilhavam. E eu não consegui parar de pensar: "Então se acredita nisso?" Eu não acredito.

A mensagem falava sobre decepções e terminava assim: "No fim, é você e Deus. E não você e as pessoas."

Que me perdoem meus amigos cristãos, mas pra mim esse "você e Deus" soa como "você sozinho". A não ser que...

A não ser que por Deus se nomeie o mundo. Que ele seja tudo. O bem e o mal, que não existem. O claro-escuro. Os seres todos. As pessoas, inclusive.

Todos os dias quando acordo (eu sei que dá vontade de cantar "não tenho mais o tempo que passou", mas não, não é isso) eu tenho o meu tempo de me entender viva. O tempo de me sentar na cama e perguntar: "Por quê?" É um "por que tenho de me levantar?" e a resposta pode ser o pão com manteiga (sempre acordo faminta), um sol e uma bicicleta, um compromisso de trabalho ou um alguém. Mas eu sei que meu diário "por que hoje?" no fundo é um permanente "por quê?" Por que vida?

Que esteja talvez errada minha interpretação, mas se "eu e Deus" for eu sozinha e "eu e as pessoas" for eu e o mundo, eu fico com as pessoas. Eu sempre ficarei com as pessoas, mesmo que elas me decepcionem diariamente e eu, também, as decepcione com frequência. Mesmo que estejam de passagem, eu fico com as pessoas. Eu fico com o amor. Mesmo que ele morra e renasça transfigurado. Mesmo que doa.

Porque eu não vejo sentido na vida se não o de acrescentar à Vida, aquela outra, que é muito maior.

Eu sei. Eu sei que depositar o sentido da própria existência nos outros (nunca é apenas um outro imutável) nos faz frágeis. E eu sei que de fragilidade é feita toda terra por onde correm os rios. É o deixar-se perfurar que nos nutre. Por isso fomos feitos de vazios, para que nos deixemos atravessar.

E entre as tantas formas de amor em que já me transfigurei, não me lembro de ser tão fácil levantar da cama plena de sentido como quando fui mãe-tamanduá. Havia um filhote para alimentar e ensinar a ser. Havia uma vida para entregar, sendo, ao mundo. Responsabilidade de fazer com que vida seja, torna simples entender por que se é. Eu era.

Eu em mim seria um bloco sólido. Amor nos torna perpassáveis. Eu me quebrei em pedaços, mais uma vez, quando soube da morte daquela bebê tamanduá. Ela que me fez mãe. E a dor me fez pó, areia, terra. Mas, porque posso me despedaçar, é que as árvores em mim se enraizam. Isso é vida.

No fim, eu nunca é só eu.

quarta-feira, 7 de dezembro de 2011

Eu acredito em Papai Noel


Quando pequena, eu temia ter insônia na noite de Natal. Isso porque meu pai dizia que Papai Noel só aparecia quando dormíamos. O velhinho barbudo tinha desses poderes, para saber se estávamos acordados e para entrar por qualquer fresta. É claro que ele, sendo esperto, entrava pela varanda, que era larga e podia abrigar seu trenó com quantas renas, duendes e presentes ele quisesse trazer. Quando abríamos os olhos, pela manhã, lembrávamos que era Natal e corríamos para a árvore montada na sala, sob a qual nos aguardavam os brinquedos.

Certa vez havia vários presentes debaixo da árvore: uns brinquedos, um disco da Angélica, camisetas personalizadas do Garfield (na minha havia escrito "I love lasagna", pois desde criança eu tinha fama de gulosa). Corremos para mostrar aos nossos pais. Meu pai dizia que era improvável que Papai Noel trouxesse tantos presentes e, virando-se para minha mãe, perguntava se ela não tinha posto alguns ali. Para mim aquilo era a prova mais concreta da existência do velhinho. Eu usava tal argumento em todas as discussões com as outras crianças do prédio, que duvidavam de sua existência: "Se fosse mentira, meu pai nunca acusaria minha mãe!"

Eu tinha dez anos de idade quando ganhei o último presente do Papai Noel. Era uma maquininha de tricô. Eu fiquei fascinada com o brinquedo, com que fiz muitos vestidos para a Barbie, gorrinhos para bonecas e centopeias estufadas. Um dia um amigo do meu pai apareceu em casa e me pediu para ver meu presente de Natal. Enquanto lhe mostrava, orgulhosa, ele comentou: "Eu que ajudei seu pai a escolher", ao passo que meu pai lhe dava cotoveladas, sussurrando: "Papai Noel... Papai Noel..." Hoje desconfio que meu pai deve ter encomendado com seu amigo aquele momento de desencanto, afinal, ter uma filha que ao dez anos ainda acreditava em Papai Noel podia ser preocupante.

Voltando à tenra infância...

Ao lado do nosso prédio, havia uma casa onde morava um casal de velhinhos, que carinhosamente chamávamos de vovô e vovó. Tocávamos a campainha em bando, eles vinham nos receber e nos davam balinhas. Saíamos correndo, doces e selvagens.

Por isso, por mais que caluniem Papai Noel, dizendo ser o símbolo do capitalismo, do consumo desenfreado e haja até quem diga que ele é invenção da Coca-Cola, não há quem me faça desacreditar no velhinho bondoso, que passa o ano fabricando brinquedos só para alegrar as crianças no Natal. E, por mais que diariamente eu seja esbofeteada com a violência cotidiana, eu insisto em acordar todos os dias acreditando na bondade ilimitada.

Foi, pois, aos dez anos de idade que me foi revelada a fonte dos presentes que apareciam sob a árvore. Mas foi-me ensinado desde muito pequena que Papai Noel é mágico, que ele sabe quando estamos adormecidos e sabe entrar por qualquer fresta. E coisas mágicas não requerem explicação. Eu creio em um mundo bonito, em pessoas boas, em um querer-bem universal. Eu acredito em milagres.

E eu, sobretudo, acredito em Papai Noel.