terça-feira, 29 de abril de 2014

O Vento



Eu saía de um restaurante em Brasília, quando uma moça me parou:

- Lian?

- Isso - respondi, confusa, sem conhecê-la.

- Eu vi que você postou na internet que precisava de carona para voltar de Alto Paraíso. Te reconheci passando. Eu volto no mesmo dia que você, podemos combinar.

Trocamos telefones e fui embora achando incrível aquilo. Ainda por cima, chamava-se Brisa, a garota. Bonito nome, como são bonitos os encontros.

Por isso hoje não me preocupo tanto com o que se leva. A gente sempre leva, ainda que não. Ainda que não nos reencontremos em vida.

- É triste, porque as pessoas vão embora e não sabemos se um dia as veremos de novo - desabafou um garoto - quando víamos os índios Mebengokré, com quem passamos uma semana, subirem no ônibus que os levaria de volta à sua aldeia.

Eu também fiquei triste, ao vê-los partir. Mas gosto de duvidar da linearidade do tempo. E aí tudo é encontro. E o encontro, em si, é a manifestação do divino.

Eu ganhei um nome indígena: Gréipu. Ganhar um nome é nascer para alguém. O nascimento é um encontro, e eu terei sido Gréipu desde sempre, mesmo que não os veja mais. Eu acredito que tudo é desde sempre e para sempre. Dentro do fluxo, o eterno.

- Quando crescer, quero casar com você. - me disse Davi, meu novo melhor amigo, de cinco anos de idade, sem saber que falava no eterno, isso que nos impele a querer guardar alguém.

- Mas então você vai ter que crescer muito, né? - brinquei.

- É. - ele me respondeu - Antes que você morra.

A morte - fui lembrada subitamente.

Mas a vida.

Acabei me desencontrando da Brisa e, muito convenientemente, resolvi passar mais tempo tomando banho naquele rio, que não era o de janeiro. E voltei dias depois, com outra carona, sem sequer tê-la conhecido. Mas, mesmo não sendo levada pela Brisa, é bonito que ela tenha passado. E que a gente continue seguindo com o vento.

A vida é um sopro.

O encontro é maior.