terça-feira, 24 de fevereiro de 2015

Sempre que alguém me pergunta sobre cafés e restaurantes, dou essa resposta: que não conheço quase nada. Frequento sempre os mesmos lugares.
Estou me transformando no meu pai, que tem seu lugar certo ao sofá. E nem me queixo. A fidelidade me traz pequenas alegrias que me são imensas.
- Se eu fosse você, experimentaria tudo! - ouvi algumas vezes.
Mas nem sou ingênua a ponto de acreditar que consumir coisas diferentes caracteriza necessariamente experiências distintas. E nem tola a ponto de não perceber que a mesma coisa jamais é a mesma. E o que acho bonito é ver as pequenas transições. Conquistar lentamente um espaço. Ganhar a confiança das pessoas. E confiar também.
Frequentar a mesma casa de lassi e ver o sorriso do moço quando chego.
- Eu quero um lassi de...
- Eu já conheço o seu sabor! Pode se sentar!
É coco com romã. Mas no outro dia ele sugeriu:
- Hoje tenho morangos frescos. Quer?
- Como não?
- E amanhã quero que você prove o de chocoball.
- Não sei... Essa coisa de lassi com chocolate, não sei se combina.
- Mas não é chocolate. É lassi puro com pedaços crocantes dentro.
- Está bem.
Acordo pensando no chocoball e era mesmo tão bom.
Ontem, contrariando meu médico ayurvédico, resolvi jantar um lassi:
- Você ainda tem morangos?
- Tenho.
- Então eu quero um de morango com romã.
- Amanhã vou fazer um sabor especial pra você. - ele ofereceu - Por causa do festival, meu pai vai trazer esse ingrediente, aí você prova. É um lassi especial.
Eu torço pro lassi especial não ser o special lassi, que é de maconha. E aceito o agrado como aceitasse entrar por uma porta e viver em um mundo que passa a ser meu, também.
Depois vou comprar frutas na barraquinha de sempre. Pago quarenta rupias por uma dúzia de bananas, após ver a moça ao lado pagar o mesmo por oito. O homem descasca uma banana a mais e me entrega. O outro sempre me oferece uvas, que esfrego muito na roupa antes de comer.
E tem também o Dosa Cafe, com a melhor dosa e o melhor da chai da cidade. E uma vaca que passa lá todos os dias, a pedir comida. E o dono que a alimenta diariamente. É o lugar da constância, e às vezes volto só para mostrar que continuo por ali.
O dono fica em silêncio e às vezes, só às vezes, resolve falar alguma coisa. Mal entendo seu inglês confuso, mas aceno com a cabeça.
- Desculpe meu inglês ruim.
- Imagina. Preciso aprender hindi.
- Você pode vir à tarde, quando o movimento é menor, e traga um caderno. Aí eu te ensino.
São bonitas assim, as pessoas, quando as vemos de perto. E perto costuma ser questão de tempo, de insistência, de olhar mais de uma vez. E de novo e de novo.
Quase todos os lugares que frequento, o faço pelas pessoas. Apenas um deles escolhi pelo lugar mesmo. Próximo de casa, com um tatame confortável para sentar. Comida normal, embora eu tenha encontrado o meu prato, que é excepcionalmente bom. Os ovos sempre vêm errados e o chá com pouco gengibre. O atendimento era sempre ruim, de má vontade. Mas por alguma teimosia eu continuava voltando ao local.
Então um dia percebo que minha insistência começa a amolecer as pessoas. E eu não sei exatamente qual foi a chave, mas elas passam a lhe sorrir e até a trazer guardanapos espontaneamente. O chá vem mais forte, porque agora elas sabem o seu jeito. E perguntam por você quando sentem sua falta. E até a deixam colar placas anti-fumo naquele que você decidiu ser seu espaço. Um espaço conquistado dia a dia.
- Eu gosto disso, sabe? - falei a um amigo, enquanto divagava.
- Disso o quê?
- De pessoas difíceis. De conquistá-las aos poucos.
Gosto de conhecer pessoas e lugares diferentes. Especialmente se eles forem os mesmos, mas outros. O tempo e a constância me permitem isso: que eu cave mais fundo.
É pelos buracos que eu pretendo explorar o mundo.

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